segunda-feira, 18 de julho de 2016

Mundo Perdido

Design de Pedro Inoue (capa) e Guilherme Xavier/Desenho Editorial (miolo).

Mundo Perdido
Autor: Michael Crichton
Designer: Pedro Inoue (capa) e Guilherme Xavier/Desenho Editorial (miolo)
Editora: Aleph
Fonte: desenhada para estas edição (capa), Story Brush (miolo).


Dando continuidade ao lançamento, no ano passado, do clássico de ficção científica Jurassic Park de Michael Crichton, a editora Aleph lançou este ano a continuação, O Mundo Perdido (também adaptada aos cinemas por Steven Spielberg em 1998). O projeto gráfico é uma continuidade da linha gráfica já desenvolvida anteriormente tanto na capa (cujo designer Pedro Inoue foi entrevistado por esse blog, na ocasião do lançamento de Jurassic Park), quando no miolo, desenvolvido por Guilherme Xavier, do estúdio Desenho Editorial.



Uma particularidade do conjunto formado pelos dois livros é que, assim como muitas obras que já foram adaptadas para o cinema, a iconografia do filme as vezes é tão marcante que pode limitar o trabalho do designer. No caso de Jurassic Park, há ainda o detalhe de que a capa original da edição americana de 1989, criada por Chip Kidd (do qual falei neste outro post) se tornou tão icônica, que acabou sendo absorvida pelo marketing do próprio filme pouco tempo depois, de lá para cá se tornando uma das marcas mais conhecidas dos anos noventa.



Curiosamente, o mesmo aconteceu com a capa da primeira edição do Mundo Perdido de Crichton, também criada por Kidd. Trabalhando sobre o desenho do esqueleto de tiranossauro criado por ele próprio, Kidd e os editores da Alfred A. Knopf, confiantes de que o primeiro livro (e o filme) já se tornavam tão conhecidos que, comercialmente, não seria necessário muito para apresentar a continuação, resumiram a sinopse em apenas três palavras: SOMETHING HAS SURVIVED. Para surpresa de Kidd, quando do lançamento do primeiro trailer e cartazes de O Mundo Perdido, a tagline da continuação, tão marcante quanto o logo do primeiro livro, foi também incorporada ao marketing do filme.

Contracapa e capa da primeira edição americana, por Chip Kidd 
Coloco isso aqui para ressaltar a qualidade do projeto gráfico desenvolvido pela Aleph (e, numa nota pessoal, digo isso com a propriedade de um aficionado por Jurassic Park que coleciona diversas edições do mesmo livro). Apesar de toda a pesada bagagem iconográfica da franquia, as edições brasileiras conseguiram algo que nenhuma editora estrangeira conseguiu alcançar até agora: dar uma personalidade própria aos livros, ressaltando suas existências enquanto obras literárias independentes dos filmes que os adaptaram posteriormente.

Abaixo, uma rápida entrevista com Guilherme Xavier, do estúdio Desenho Editorial, sobre o projeto gráfico do miolo de Mundo Perdido.


Como é a dinâmica entre o trabalho do capista e a diagramação do miolo, feita por vocês? O que vem primeiro, como um se sintoniza com o trabalho do outro, etc?
Neste projeto, o trabalho foi feito em paralelo, o que exige um direcionamento dos editores para ficarem com o mesmo tom. Enquanto o Pedro desenvolvia a capa, nós trabalhávamos no projeto gráfico. É comum acontecerem pequenos ajustes para as duas criações conversarem. Em outros projetos, pode acontecer de maneira diferente, como usar elementos da capa para aplicar no projeto.


Vocês trabalham com livros com uma carga iconográfica pop bastante forte (Aliens, Star Wars, Jurassic Park), mas uma das coisas que se destaca no projeto gráfico tanto de Jurassic Park quanto de Mundo Perdido é o quanto eles parecem originais e novos comparados com tudo o que já foi feito antes. Como é essa relação com o material, até onde vocês acham que devem ficar reverentes à iconografia original, ou criar algo novo? Isso é algo que é combinado com a editora? No caso de Mundo Perdido e Jurassic Park, como foi esse processo?
O grande desafio é redesenhar esse universo específico de uma maneira fresca, mas mantendo o link com o original. O leitor precisa saber instintivamente o que aquela peça está comunicando, não há tempo para uma adaptação ou introdução sobre o que está sendo discutindo ali. Existem editoras que preferem apostar no lugar-comum, até subestimando um pouco a capacidade de abstração do leitor e focando no comercial. Felizmente, nos livros do Michael Crichton, a editora Aleph me pediu que o projeto gráfico fosse diferente do que já existia. Avesso às tipologias originais que estão datadas (mas tiveram sua relevância na época) e as referências visuais dos filmes de Spielberg. Como ponto de partida, idealizamos o ambiente em que os dinossauros viviam e o clima que a narrativa nos leva. Depois me muita pesquisa e alguns testes, achamos o caminho para criar essa identidade e a partir daí se desdobra todos os elementos do projeto.


Como foram produzidas as artes internas? O lettering do título interno foi criado especialmente para o livro?
No início, pensamos em trabalhar com papel rasgado e os desdobramentos gráficos disso. Chegamos a fazer alguns testes, rasgando diferentes papéis e depois fotografando. O resultado não foi o esperado e começamos a fazer outros testes com brushes e texturas. Dessa vez, gostamos bastante. A produtividade ganhou muito também, e pudemos extender o projeto para outras páginas além do rosto e aberturas de capítulos. Todas as páginas em que há interferências, elas são únicas e diferentes. As artes internas foram aperfeiçoadas no desenvolvimento do projeto, ora inserindo outros elementos, ora brincando só com os elementos tipográficos. E, sim, o leterring do título foi criado especialmente para esse livro.


Quais as fontes utilizadas, e porque elas foram escolhidas?
Procurei trabalhar com fontes de impacto, ácidas e marcantes. Usei a Story Brush da typefoundry Majestype. Foi um ótimo achado, era exatamente o que buscava.


Houve alguma dificuldade técnica específica que precisou ser contornada?
A maior dificuldade, e uma das poucas exigências do editorial, foi aplicar as ilustrações de aberturas de capítulo do livro original. Isso aconteceu nos dois livros do Crichton, tanto no Jurassic Park quanto no O mundo perdido. São imagens que mostram a progressão da curva fractal durante os capítulos. Como eram publicações antigas, e só tínhamos a edição impressa de época como fonte, as imagens estavam muito reticuladas. Tão reticuladas, que conforme as configurações ficavam mais complexas era muito difícil entender como era a imagem original que queriam reproduzir. Isso nos impedia de utilizar a saída mais simples que seria digitalizar as imagens. Elas têm muitos detalhes e formatos diferentes. No primeiro livro, o módulo é mais claro. Já no segundo, as imagens pareciam desconexas entre si. Tentamos achar alguma informação sobre o significado delas e também foi difícil, apenas especulações de fãs em fóruns. Recriamos todas as imagens, lembro-me que em uma delas usamos cerca de 700 formatos. Foi trabalhoso mas conseguimos um resultado muito superior do que as imagens digitalizadas do livro original.


Guilherme Xavier é diretor de arte há mais de 15 anos, fundou o estúdio Desenho Editorial em 2006 e desde então desenvolve capas e projetos gráficos para editoras.

Um comentário:

Ygor Moretti disse...

Que ótimo trabalho e de coragem!!! Difícil mesmo se desvencilhar da capa original, mas eles conseguiram fazer algo novo que no entanto mantém o link com o projeto original. Muito Bom!!!

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